Um acordo anunciado como histórico entre Estados Unidos e Reino Unido acabou colocado em compasso de espera e expôs como tecnologia, comércio e política estão hoje profundamente entrelaçados.
O chamado Tech Prosperity Deal, apresentado durante a visita do presidente americano Donald Trump a Londres, em setembro, previa cooperação em áreas estratégicas como inteligência artificial (IA), computação quântica e energia nuclear avançada.
Apesar de o governo britânico afirmar que as negociações seguem em andamento, Washington decidiu pausar a implementação do pacto, alegando falta de avanços do Reino Unido em compromissos comerciais mais amplos.
O impasse revela que, para os EUA, a agenda tecnológica passou a ser usada também como instrumento de pressão em disputas econômicas.
O Tech Prosperity Deal foi formalizado como um memorando de entendimento, sem caráter obrigatório imediato. O texto condicionava sua entrada em vigor a “progresso substancial” no Economic Prosperity Deal, acordo comercial mais amplo firmado meses antes entre os dois países.
Segundo autoridades americanas, esse progresso não ocorreu. Dois pontos concentram o atrito: o imposto britânico sobre serviços digitais, que atinge principalmente grandes empresas de tecnologia dos EUA, e as regras de segurança alimentar que restringem a entrada de produtos agrícolas americanos no mercado do Reino Unido.
Diante disso, Washington optou por congelar o acordo tecnológico. A leitura é clara: avanços em cooperação em IA e inovação dependerão de concessões comerciais mais amplas por parte de Londres. A estratégia não é isolada e tem sido adotada pelos EUA em outras frentes de negociação internacional.
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O governo do primeiro-ministro Keir Starmer evita tratar a situação como um rompimento. Em comunicados oficiais, Londres afirma que as conversas seguem ativas em diferentes níveis e que o acordo continua sendo um objetivo estratégico.
Sinais vindos da própria Casa Branca reforçam essa interpretação. O assessor científico do governo americano, Michael Kratsios, declarou que os EUA esperam retomar o trabalho conjunto assim que o Reino Unido avance na implementação do acordo econômico mais amplo. Na prática, a porta segue aberta, ainda que condicionada.
Enquanto isso, investimentos anunciados paralelamente ao acordo permanecem de pé. Empresas como Google, Microsoft e Nvidia já sinalizaram mais de US$ 40 bilhões em projetos ligados a IA e data centers no Reino Unido, iniciativas que, por ora, não dependem diretamente do avanço imediato do pacto governamental.
Analistas avaliam que o impasse tem menos a ver com tecnologia em si e mais com uma disputa política e comercial mais ampla.
O episódio ocorre em um contexto de endurecimento da postura americana frente a regulações digitais, inclusive contra a União Europeia, acusada por Washington de impor regras “discriminatórias” a empresas de tecnologia dos EUA.
Nesse cenário, o acordo com o Reino Unido deixa de ser apenas uma iniciativa de cooperação tecnológica e passa a refletir uma disputa global sobre comércio, regulação e poder econômico. A IA, longe de ser apenas uma pauta técnica, tornou-se parte central do jogo geopolítico.
Com informações de BBC, The Guardian e The New York Times.
Foto: Jametlene Resk/Unsplash

